A BARBÁRIE IMPREGNADA NO BRASILEIRO
A barbárie humana não é um fenômeno distante, reservado a livros de história ou tragédias estrangeiras, ela pode estar impregnada na nossa alma, e seus efeitos são devastadores.


A BARBÁRIE IMPREGNADA NO BRASILEIRO
A barbárie humana não é um fenômeno distante, reservado a livros de história ou tragédias estrangeiras. Ela pode ser percebida por qualquer pessoa atenta, de duas formas distintas: forma explícita, demonstrada por meio das mais diversas maneiras de perseguição e destruição da vida humana — guerras travadas sem justa causa, com crimes de guerra inquestionáveis; prisões mantidas à margem da lei; torturas e execuções disfarçadas de “acidentes”, como quedas da janela do 17º andar, por pessoas ligados a altos postos no governo russo, noticiado de tempos em tempos; num paredón cubano ou na cadeia, como vemos noticiarem, constantemente, vindo da China, Venezuela e Nicarágua.
Há os que são perseguidos e mortos por simplesmente se oporem ao regime vigente, por diferenças ideológicas ou até mesmo assassinados pelos próprios “parceiros” de crime, cuja finalidade é evitar um adversário no topo do poder no futuro.
Vê-se que tais barbáries explícitas são relatadas, comprovadas, noticiadas, explicitadas contundentemente em países socialistas ou evidentemente promovedores de violações contra os direitos humanos, tais como Rússia, China, Venezuela, Nicarágua, Camboja, Cuba, Coreia do Norte, Laos, Vietnã e por aí vai. Observe que tudo isso se deu (e ainda se dá) em países alinhados às ideologias mais nefastas de sempre: comunismo, socialismo, marxismo etc. O Brasil, por sua vez, pelo atual regime, alinha-se a tais países quando prende inocentes e faz com que morram na prisão, tal como ocorreu com o “Clezão” e tantos outros desconhecidos do grande público no dia a dia. Este fato é uma grave violência aos direitos humanos, aplicável, por exemplo, a Global Magnitsky Act, aos que deram causa à morte.
Pois bem, dito isto, o fato é que qualquer pessoa que se julgue um ser humano digno de estar vivo concordaria também que, nesses países, não há respeito algum aos direitos humanos. Curiosamente, os direitos humanos são exaltados por muitos que, ao mesmo tempo em que clamam por garantias constitucionais, aplaudem regimes notoriamente opressores — como os de Cuba, China ou Nicarágua. Fazem elogios a Putin, que há mais de duas décadas detém o poder russo, eliminando todo e qualquer opositor que queira disputar a corrida presidencial.
Essa duplicidade revela algo mais profundo do que incoerência: revela a normalização da contradição como virtude, fato factível e verificável com muita facilidade. A contradição é a espinha dorsal desses tais “defensores” da liberdade e das garantias constitucionais. Querem e valorizam, no discurso, os direitos humanos e, por outro lado, favorecem as ditaduras mais horrendas existentes.
A outra forma de ver a barbárie humana é a forma implícita, não menos grave que a forma explícita de barbárie, é a sua forma implícita, camuflada pelo crime cotidiano de muitos: assaltos com morte, insegurança permanente, censura prévia, furtos, violência de toda espécie, corrupção generalizada — não apenas por governantes e políticos, mas pelo próprio povo nas diversas relações do dia a dia.
Resguardadas as devidas proporções, é óbvio que a prisão constante de civis ou opositores políticos, cumulada com tortura e morte, contra toda a população, trazendo-lhe terror permanente, é muito mais grave do que sua forma implícita, pois, tendo-se retirado o pudor e o medo da atuação criminosa contra o povo, qualquer ato, por mais bárbaro que seja, será praticado, visto que já não haverá mais nenhuma espécie de freio capaz de cessá-lo.
Há quem diga que prender uma velhinha sob a acusação de abolição do Estado Democrático de Direito é o cumprimento da lei vigente, e quem defenda, com convicção, que uma senhora de idade avançada deve ser presa por “atentar contra o Estado Democrático de Direito”, mesmo sem jamais ter pisado numa delegacia. A naturalidade com que essa opinião é defendida revela algo estarrecedor: estamos nos acostumando a desejar punições exemplares para os fracos, enquanto os verdadeiros algozes se camuflam nas sombras da legalidade. Tal desejo, de quem quer que seja, implica numa exposição clara da barbárie camuflada a que o povo brasileiro está submetido e o cultiva regularmente.
Desejar algo desse tipo a uma inocente é desumano (bárbaro) — ainda mais para os gritadores de “Direitos Humanos”. Pessoas que assim pensa, se tivessem os meios adequados e o posto de autoridade competente para realizar o julgamento e a própria prisão da velhinha, não pensaria duas vezes em cometer tal crime. Se estivesse na Nicarágua, com poder para tal, assim procederia.
Porém, esse indivíduo não está em Laos, Myanmar ou Vietnã; ele está no Brasil — país que, pela sua forma continental, não avança, da noite para o dia, em uma ditadura ao molde chinês, mas sim após décadas.
A impressão de que vivemos em uma terra de civilizados pode não passar de uma ilusão confortável. Isto se aplica a este autor, pois cá vivo. No século XVII, Padre Antônio Vieira já apontava a ausência de fé e de virtude como marcas profundas deste solo, manifestando que a barbárie desde sempre continuava no povo. Ele escreveu:
“Quando os portugueses descobriram o Brasil, acharam as pegadas de Santo Tomé estampadas em uma pedra, que hoje se vê nas praias da Bahia; mas rasto, nem memória da fé que pregou Santo Tomé, nenhum acharam nos homens. Não se podia melhor provar e encarecer a barbárie da gente.”
(Sermão do Espírito Santo)
Este é apenas um retrato simbólico de uma realidade mais profunda: a barbárie disfarçada, que sufoca o povo até o último fio de cabelo — não com gritos, mas com silêncio cúmplice. Afinal, há os que se indignam com a injustiça, os que a favorecem e os que, por medo ou descaso, nada diz.
Ora, a barbárie, desde sempre, ao que tudo indica, é parte integrante do povo brasileiro. Essa barbárie, como se vê, não é explícita, tal como na Venezuela, aos moldes dos demais países socialistas, mas não é menos perigosa e prejudicial à vida humana.
No Brasil, é cada vez mais comum ver criminosos — assassinos, estupradores, traficantes — deixarem as prisões pouco tempo depois de detidos. São liberados por aqueles que, em tese, deveriam garantir o cumprimento da lei e a promoção da justiça.
Certa vez, uma juíza, movida por compaixão, decidiu providenciar um cobertor e um café quente ao réu preso em flagrante, temendo que ele sofresse com o frio da sala de audiência. O gesto ganhou destaque e, apesar das críticas, foi posteriormente homenageada pelo CNJ. Isto é apenas um exemplo. Mas enquanto isso, quantas famílias de vítimas que sangraram no chão e não tiveram tempo de pedir por um cobertor ou café quente, permanecem esquecidas, amargando em silêncio as consequências de um crime irreparável. Eis aí um retrato simbólico, e talvez banalizado, da barbárie moral em que estamos imersos: uma civilização que treme diante do desconforto do agressor, mas silencia diante do sofrimento da vítima.
No Brasil, como dito, a barbárie não é explícita, mas camuflada e propositadamente rejeitada e escondida. Não se ensina aos pequeninos o reconhecimento dos próprios erros e as virtudes para eliminá-los, mas sim as pegadas dos maiores ideólogos dos séculos passados, quando não os “crimes” cometidos pela Igreja Católica — tal como se prega a ideia de que a Idade Média foi a Idade das Trevas.
E então, desde cedo, em vez de ensinar às crianças a beleza das virtudes e o valor do arrependimento, oferecemos a elas narrativas enviesadas, caricaturas históricas e heróis, que de heroísmo nada possuem. Como resultado, crescem sem referências sólidas ou, pior, com referências invertidas, endeusando os mais asquerosos homens que pisaram nesta terra: Lênin, Stalin, Fidel Castro, Che Guevara e tantos outros. A barbárie é cultivada desde cedo.
Isto porque vivemos numa democracia — pelo menos é o que dizem. Quem diz? Ora, os mesmos que se julgam defensores da liberdade e dos direitos humanos, mas vestem camisas com a estampa de Che Guevara, um sanguinário perseguidor de negros e homossexuais. O discurso não aguenta um segundo de realidade. Eles esbravejam alegando democracia, e é justamente por isso — por essa negação da realidade — que a barbárie continua a viger a todo vapor no país.
Para refutar essa afirmação, o ponto-chave é muito simples: basta que alguém, em sã consciência, aponte em qual país considerado democrático se condena uma mulher a 14 anos de prisão por ter pichado, de batom, uma estátua.
Observar o drama da condenada injustamente, de sua família e amigos; observar e afirmar que isso não se trata da mais absoluta violência aos direitos humanos é favorecer a perpetuação dessa barbárie aqui apontada. Diante de casos assim, o mínimo que se espera de uma consciência desperta é algum incômodo.
Silenciar diante da injustiça, ou, pior, justificá-la, talvez seja o sinal mais claro de que a barbárie já deixou de ser externa e passou a habitar nossos hábitos e afetos.
Porém, o mesmo padre Antônio Vieira, que denunciou que essa gente continuava a viver na barbárie, sugeriu que, mediante esforço pessoal, oração e a prática de atos virtuosos, essas falhas seriam eliminadas e, claro, a realidade local e, consequentemente, a nacional, mudaria.
Por fim, eis o que se espera de cada um: que faça o bem, independentemente da ideologia impregnada na consciência do outro, mas sem deixar se contaminar pelo mal e pelas injustiças perpetradas pelos bárbaros; e fazer o bem não significa concordar, aderir ou se omitir, mas promover a verdade e exigir o seu cumprimento, sob pena de perpetuar-se na mentira.
Caso contrário, a frase de indignação do maior prosador da língua portuguesa continuará a ter validade: “não se poderá melhor provar e encarecer a barbárie dessa gente”.